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Silvana Meirelles, coordenadora do Programa Mais Cultura, fala sobre a primeira Biblioteca Parque do Brasil.

on sexta-feira, 9 de abril de 2010
Medellín, na Colômbia, era uma cidade marcada pelo narcotráfico e pela violência. Mas a partir de 2006, com a inauguração de Bibliotecas Parque – uma biblioteca com um parque para que os leitores possam usufruir da leitura ao ar livre – a cidade elevou o seu nível educacional, fator que contribuiu para a diminuição do índice de violência.
Inspirando-se nesse projeto, foi implantada em Manguinhos, no Rio de Janeiro, a primeira Biblioteca Parque brasileira, em um espaço de 3,3 mil m², que sediava o antigo Depósito de Suprimento do Exército (1º DSUP). Essa área foi totalmente urbanizada, e se transformou no local de maior concentração de equipamentos sociais em uma comunidade carente da cidade, um complexo com ludoteca, filmoteca, sala de leitura para portadores de deficiências visuais, acervo digital de música, cineteatro, cafeteria, acesso gratuito à Internet e uma sala denominada Meu Bairro, para que os usuários façam reuniões da comunidade. A Biblioteca Parque faz parte do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC) e é equipada com recursos do Programa Mais Cultura.
Em entrevista ao blog Acesso, a secretária de Articulação Institucional do Ministério da Cultura e coordenadora do Programa Mais Cultura, Silvana Meirelles, explica melhor o projeto.
Acesso – Como se deu o intercâmbio com a Colômbia? Existe um convênio de parceria para a implantação da Biblioteca Parque no Brasil?
Silvana Meireles – Sim, houve um intercâmbio, uma troca de experiências em várias áreas, inclusive na área do projeto cultural e educacional colombiano, que extrapola a questão de bibliotecas parque. Claro que no caso de Manguinhos, representantes do Estado do Rio de Janeiro estiveram na Colômbia, para verificar as Bibliotecas Parque, que são referência de como um projeto conseguiu rapidamente reverter o índice de violência naquele país. A essência da biblioteca parque é ser um elemento cultural vivo. Isso tem que ser refletido na arquitetura, no acervo, nos mobiliários, nos agentes que estão trabalhando, nos horários, na programação de atividades que ela oferece no sentido de atrair jovens, crianças e adultos, numa troca inter-geracional.
Acesso – Quais as diferenças entre o projeto na Colômbia e no Rio de Janeiro?
S.M. – O equipamento cultural em si é igual, os acervos, computadores, horário de funcionamento, participação dentro da uma comunidade. Mas há diferenças gerencias: na Colômbia parte da gestão é responsabilidade do governo, e parte licitada a uma instituição similar ao SESC no Brasil. A administração após a implementação da biblioteca pelo governo é destinada a essas instituições, embora a prefeitura de Medellín, no caso, continue investindo recursos. As bibliotecas parque da Colômbia fazem parte de um projeto da prefeitura de Medellín em que cultura e educação são prioridades, tanto que 40% do orçamento da prefeitura é direcionada a essas duas questões. As bibliotecas são um desmembramento de um centro cultural que compõe uma rede ao lado do que eles chamam de escolas de qualidade, de alto nível, para formar e capacitar pessoas das comunidades em que estão implantadas. O projeto é coordenado diretamente pela prefeitura, diferente do que ocorre aqui. Mas o modelo deve ser seguido, pois associar cultura à educação é algo fundamental para aumentar o número de leitores no país. Já em Manguinhos, parte do governo estadual gerencia o espaço, em conjunto com a comunidade. Essa é uma excelente iniciativa porque além de disponibilizar equipamento cultural, delega-se o gerenciamento a quem melhor entende: as pessoas da própria comunidade. Com isso, gera-se renda e emprego para os habitantes de Manguinhos.
Acesso – Como foi escolhida a localização da primeira Biblioteca Parque do Brasil?
S. M. – A escolha do Programa Mais Cultura é federativa. Agentes federais e estaduais selam um acordo e os estados interessados pelo programa podem aderir a ele. Já a territorialização é feita a partir de critérios, como menores índices de desenvolvimento humano (IHDs), índice de desenvolvimento de educação básica (IDEB), e maiores índices de violência. Manguinhos foi escolha do governo do Rio de Janeiro, pois atende a todos os critérios estabelecidos pelo Mais Cultura. Além disso, a região congrega outras ações do governo, uma vez que no local existe área de habitação, de esporte, de atendimento à mulher. Esse conjunto de ações do governo federal foi um critério que favoreceu a escolha, pois Manguinhos faz parte do PAC 1 (Programa de Aceleração de Crescimento), e através dele as questões técnicas e burocráticas como legalização de terreno, já estão todas resolvidas. Esse critério não é excludente, mas como a biblioteca parque precisa de espaço físico, algo não disponível no país nessas áreas de periferia, Manguinhos levou vantagem.
Acesso – Quais os desafios de montar uma biblioteca numa área de risco como Manguinhos?
S. M. – Os desafios são os mesmos que se enfrenta para instalar quaisquer equipamentos culturais, não importa se é área de risco ou não. Os maiores desafios ficam por conta da manutenção e programação da biblioteca. O desafio da manutenção física é menor, por isso a dinâmica dela é nosso maior desafio, pois temos que mantê-la viva, com acervo atualizado, com gente freqüentando, e tudo isso independe da sua zona de instalação. Numa área como essa, o problema talvez seja minimizado porque a carência de equipamentos culturais é tamanha, e com a estratégia de colocar a comunidade para trabalhar, eles mesmos vão ter o sentimento de preservação. O local abriga sala de cinema, livros atuais, computadores, é bonito, é ventilado, aberto, agradável. Essas questões arquitetônicas também proporcionam toda essa dinâmica, contribuindo para que ela funcione bem, viva e atraente.
Acesso – De que outra maneira a Biblioteca Parque contribui com a população de Manguinhos?
S. M. – Além da questão da geração de renda, em que a própria população trabalha na biblioteca, ela também se relaciona com o aumento da auto-estima dessas pessoas, que ao se sentirem pertencentes a um lugar, terão orgulho de pertencer à sua comunidade. Uma biblioteca bonita, quadra esportiva, escolas boas, tudo influencia na melhoria da qualidade de vida, olhando do ponto de vista material e subjetivo. Dar oportunidade de emprego e acesso a outro universo, proporcionados pelo cinema e leitura, facilita, inclusive, a criação de novos hábitos.
Acesso – O que vocês pretendem fazer para estimular a visitação à Biblioteca?
S. M. - Quando os estados aderem ao Programa Mais Cultura, eles assumem essa responsabilidade. Quem pode administrar é quem está próximo. Seria impossível para o governo federal administrar todas as bibliotecas implantadas no país, uma vez que há uma base de uma biblioteca por município e estamos em processo de construção de mais 12 em capitais do Brasil, além de programas de pontos de leitura, e de bibliotecas para municípios com até 20 mil habitantes. Em aproximadamente 45 dias, o Ministério da Cultura prevê publicar um edital para modernização de bibliotecas, com alto investimento para acervo e capacitação de pessoal, que vai de encontro com essa necessidade de manter as bibliotecas vivas. Esse é um jeito de o governo federal tentar apoiar os municípios, mas no geral, ações de estímulo partem do governo local, assim como a manutenção do espaço.
Acesso – Vocês pretendem implantar mais bibliotecas desse tipo em outras áreas de risco social, tanto no Rio de Janeiro quanto em outros estados/ municípios? Há previsão de data?
S. M. – Sim, estamos em processo de construção de uma biblioteca em Canoas, no Rio Grande do Sul, mas ainda não há previsão de data. Nesse município há uma área com alto índice de violência. No Brasil, o campo da leitura, literatura e infra-estrutura cultural das cidades são mais amplos, pois inclui implantação de uma biblioteca em cada município brasileiro em locais que não possuam esse equipamento. Estamos investindo no Rio de Janeiro, e, há um mês, foi inaugurada a Biblioteca de São Paulo, no Carandiru. Em setembro de 2009 também foi inaugurado no Ceará o primeiro Espaço Mais Cultura no país, batizado de Cuca Che Guevara – Centro Urbano de Cultura, Arte, Ciência e Esporte. Apesar de não ser uma biblioteca parque, é um centro esportivo e cultural com cinema, teatro, várias salas de oficina e uma biblioteca em menor tamanho.
Acesso – A favela da Rocinha vai receber obras do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC). A biblioteca parque está inclusa nesse projeto?
S. M. – Na favela da Rocinha vai haver um Espaço Mais Cultura, em que conterá um grande acervo, apesar de o foco não ser nos livros. A construção desse espaço está mais avançada que em Canoas, pois parte das obras já está pronta, mas ainda não temos previsão de entrega.
Acesso – Além das bibliotecas, existem outras ações de estímulo à cultura em andamento, inspiradas no modelo colombiano?
S. M. – O Programa Mais Cultura tem muita inspiração no modelo colombiano, tanto no âmbito da territorialização quanto na ideia de que pessoas precisam ter acesso à cultura. Vários dos princípios colombianos foram absorvidos pelo Programa Mais Cultura no que diz respeito a essa democratização do acesso à cultura. Apesar das realidades serem muito próximas entre Medellín e Rio de Janeiro, a ação não foi copiada, pois, por exemplo, na Colômbia, a educação está muito ligada à questão da cultura. Aqui, ainda não conseguimos essa aliança.

Fonte: Ascom/MinC

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